terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Sherlock - Um estudo em progressão



A personalidade está intrínseca ao ser humano (principalmente no sentido da persona grega). Em todas as áreas do conhecimento e agir da pessoa a personalidade é determinante na visão evolutiva (ou não) que os saberes vêm atingindo. O homem no sentido micro e macro expressa-se através das máscaras e, convenhamos, isso é o que mantém as engrenagens sociais funcionando pelo bem ou pelo mal. A humanidade externa sua personalidade de várias formas e facetas, uma delas é a criação artística, principalmente no âmbito literário. Pessoas criam personagens, em sua maioria protagonistas, em suas obras para expor um alter ego reprimido ou almejado. Como exemplo temos o Sir Ian Fleming (oficial da Inteligência Britânica) com seu sensacional James Bond e o Sir Arthur Ignatius Conan Doyle criador do maior detetive particular da história das artes como um todo, Sherlock Holmes, que dispensa comentários. Apesar de dispensar comentários, é sobre este último que gostaria de tecer alguns, com escopo maior na mais recente caracterização televisiva do personagem.


Sherlock Holmes, em linhas gerais, é um detetive particular sui generis que resolve casos bizarros de maneira simples e casos simples de maneira bizarra, sempre com uma peculiar genialidade que transcende as barreiras do “bom senso” positivamente falando. Ler a obra do Doyle é um exercício de imaginação e deleite extremos. Possui um sidekick de nome Watson que é um médico com comportamento totalmente oposto ao do detetive, mas que consegue se encaixar no jeito de ser e no modo de agir extravagante e retraído ao mesmo tempo de Holmes.


Mesmo os contos de aproximadamente duas páginas é capaz de causar espanto pela perspicácia britânica com que os casos são narrados até sua solução, por falar em britânica, esqueci de citar que Holmes  é londrino e isso faz uma enorme diferença. Qual o porquê disso? Bem, por possuir personalidade britânica é que faz o detetive ter magnetismo exacerbado, pois os britânicos são capazes de resolver as coisas “na conversa” e de forma não frenética como gostam os americanos. Um exemplo, sem spoiler, em um conto Sherlock resolve um caso sem sair de casa, aliás, sem sair da cama.


O detetive teve várias adaptações de suas aventuras em diversos tipos de mídia. As de cinema foram quase sempre bem sucedidas, inclusive uma versão que narra sua juventude. Obra deveras divertida com o olhar de Steven Spielberg. Outras, como as mais recentes com Robert Downey Jr., tornaram o personagem mais caricato e com ares de herói de ação. Os filmes não são ruins, mas destoam um pouco da atmosfera do célebre morador da Baker Street 221B tentando transformar Holmes em um Tony Stark vitoriano. Do lado das produções televisivas temos a série britânica Sherlock que traz as peripécias dedutivas e até indutivas do prodígio inglês para os tempos atuais. Confesso que fiquei com um pé atrás (aliás, com os dois pés), pois seria um terreno pantanoso trazer algo que se encaixa melhor com carruagens, lamparinas e neblina, opa, Londres ainda tem neblina. Porém, por indicação da amiga Miriam Soares (aqui está o endereço de seu Blog http://www.amodadamira.com/blog/) resolvi dar uma chance à série e partir de então senti-me lendo Doyle novamente sem ter que abrir um livro sequer. A transposição dos personagens clássicos para os dias modernos foi feita de forma magistral bem como o uso dos gadgets que são maravilhosamente adaptados, só para terem noção, a primeira “aparição” do Sherlock é na forma de mensagem de texto via celular, impagável.


Mark Gatiss e Steven Moffat são os “criminosos” que foram capazes de nos proporcionar momentos de apreciação extrema sem ao menos conseguir piscar diante da tela. Os roteiros são excelentes e inteligentes de forma que as principais aventuras contidas nos livros são retratadas com maestria. A BBC deve estar rindo à toa com o sucesso instantâneo do seriado, estreou em 2010 e a audiência só se multiplica.


Benedict Cumberbatch, Martin Freeman, Una Stubbs entre outros fazem parte fazem parte do elenco escolhido minuciosamente. Com destaque para o Benedict (que aqui seria chamado carinhosamente de Biné) que parece ter pulado das páginas do livro para a vida real. Consegue passar a empáfia e simpatia ao mesmo tempo, exatamente como é o “monstro” criado por Conan. Sua atuação é tão perfeita que mesmo sem emitir qualquer som nos faz entender sua capacidade de raciocínio. E o que falar do Martin Freeman? Um perfeito Watson! Meio desajeitado e impressionado com o novo amigo que é diferente de tudo o que já conheceu antes. Os personagens nem tão secundários assim, também são um show à parte, tanto o Mycroft (irmão de Holmes) bem como o moderno Moriarty (nêmesis do detetive) são impecáveis, tudo é bem encaixado. Mesmo com a duração de uma 1h e 20min por episódio, parece que somente poucos minutos foram passados. Outro ponto a ressaltar é o humor contido nos episódios, ora, são ingleses, ingleses!!!! Se não houvesse o senso de humor peculiar aos  “batata quente na boca”, não seria uma série britânica. Damos risadas até nos momentos mais tensos (fico imaginado um John Cleese no papel de Mycroft, mas é só um devaneio...). A série está em sua 3º Temporada sendo que cada uma possui 3 episódios somente, mas acredito ser esta a medida certa. O único porém que posso destacar é que aqueles que nunca tiveram contato com as histórias do detetive podem demorar um pouco a acompanhar o desenrolar maluco das tramas, no mais, tranquilo.


É elementar(citação péssima eu sei) que Sherlock é uma obra que nos faz pensar que ainda há salvação para a programação televisiva, nos faz pensar que a televisão ainda pode ser provedora de entretenimento saudável e inteligente, Sherlock é uma série que nos faz pensar que clássicos podem ser reavivados sem ofensa aos originais, Sherlock é uma série que nos faz pensar!